Então vamos fazer o seguinte: hoje vocês leem o meu conto e na quarta eu postarei umas capas bem legais.
Então vamos ao décimo texto daqui do DSA (oba, gosto muito de números redondos!). Espero que vocês gostem, pois eu achei uma fofura:
O Ritmo da Vida:
E aquele ritmo? Tic-tac,
tic-tac... Lia achava uma delícia. Ficava um tempão ouvindo-o,
percebendo que cada “tic” e cada “tac” acompanhava os passos do palito
magrelinho. Logo começou a achar que a vida do mundo inteiro seguia aquele
compasso, e cada vez mais sua certeza aumentava; pois se haviam tantos, em
todos os cantos, era óbvio que devia ser algo extremamente poderoso ou incrivelmente querido.
E a variedade que ela encontrava? Uns bem coloridos, outros
preto-e-branco; uns pequenos, outros grandes (inclusive um enorme na torre da
igreja, que batia gostoso demais a cada hora, uma música bonita mesmo de
escutar), uns amarrados nos pulsos das pessoas (gente grande e pequena) e até
mesmo um pequenininho, feito anel, que sempre estava no dedo mindinho do vovô.
E tinham uns estranhos, quadrados, que só tinham aqueles
símbolos maçantes que ela não entendia. Desses ela não gostava. Tampouco lhe agradava
aqueles que cismavam de tocar bem cedinho, uma musiquinha irritante que só ela;
e obrigavam a mamãe a acordá-la. E nem apreciava aqueles que tinham só os
palitinhos, sem tracinhos e nem símbolos; esses pareciam vazios, sem vida, imprecisos...
Lia não demorou a descobrir o nome daquilo: relógio. E achou
o nome tão peculiar quanto o objeto. E mais intrigante ainda foi quando ela
percebeu que todos os adultos ficavam mais tensos, mais apressados, mais
frenéticos, a cada vez que olhavam para um deles. A garota começou a atinar que
isso só poderia acontecer porque todos tinham medo do relógio, que ele os tinha
como escravos. E pensou que o grande Senhor Relógio só podia ter dado uma ordem que deveria ser cumprida naquele instante; ordem essa que, caso não cumprissem, seriam severamente castigados (ficando sem
sobremesa e tudo mais).
E então imaginou que havia um relógio enorme, com uma cara
torta de mau, que empunhava em suas mãozinhas seus ponteiros, brandindo-os como
um espadachim. Na cabeça de Lia, ele dizia “Tic” a cada estocada que dava nas
pessoas grandes, e bradava triunfante: “Tac!", cada vez que atingia seus
traseiros. Aquele pensamento era tão engraçado que durante semanas ela ria sem
parar toda vez que surpreendia um adulto olhando para um relógio. E, é claro, todos a
olhavam emburrados, como se ela estivesse debochando da pressa em que estavam, ou das suas caras amassadas de quem não sabe se divertir.
Um dia a menina entrou para a escola e começou a aprender um
mundo de coisas. Aprendeu que haviam letras que juntas poderiam contar
histórias, aprendeu uma coisa chata chamada matemática — que ninguém no mundo parecia
gostar de verdade —, aprendeu nome de bicho, de lugar, de rio, e também que o
relógio era apenas uma chatice de instrumento que dividia o dia em um montão de
pedacinhos. Imagine sua decepção quando ela soube que os adultos não tinham
medo dele, que ele não tinha cara de mau, que não espetava os bumbuns com “Tacs”,
que os adultos apenas se apressavam para cumprir seus horários; pois eram
cheios de regras e não sabiam parar nem por um segundo para apreciar o ritmo
gostoso do ponteiro magrelinho.
Apenas sobre uma coisa ela julgava estar certa desde o
principio: que as pessoas grandes sempre estariam à mercê de seu poder absoluto,
e que aquilo não mudaria até o momento em que quisessem voltar a ser como as crianças.
(Sheila Lima Wing)
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Beijinhos Alados,
Muito legal este texto... Amei ;)
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